Eu tinha uns sete anos. Não, oito. Não, sete mesmo, e pedi pra minha irmã pra gente fazer (leia-se: ela fazer e eu ficar olhando e perguntando "tá pronto?" "e agora?") brigadeiro na panela. Achamos os ingredientes, a lata de leite moça que minha mãe comprava pra fazer pudim no fim de semana, mas que nunca sobrevivia até ele, o nescau e etc. Na euforia de comer logo, pegamos qualquer panela. E foi nessa hora que entramos numa das maiores encrencas da história.
Pegamos a caneca que minha mãe usava pra fazer café, todos os dias. Eis que o brigadeiro queimou. Talvez minha irmã tenha se irritado com minhas perguntas de dois em dois segundos, distraiu da panela (ou melhor, caneca) pra brigar comigo e o brigadeiro queimou. Que desperdício. Mas a gente comeu assim mesmo. Evitamos as bordas e comemos direto da panela. Chegou no fundo da panela e no fim no brigadeiro, descobrimos que tava tudo grudado, preto e horrível. Lavamos (leia-se: minha irmã lavando, esfregando, suando e eu olhando e perguntando "saiu?" "e agora?"), lavamos, lavamos e nada. O desespero típico de crianças de oito (ou sete) anos tomou conta da gente. E agora, o que é que a gente vai falar pra mãe?
Veja bem, não éramos crianças obesas nem nada. Éramos muito magrinhas (bons tempos). Mas o problema seria ter acabado com o leite moça que minha mãe tinha comprado pra fazer o pudim. Já conhecíamos essa novela. E aí tomamos a atitude mais inteligente que duas crianças de sete (ou oito) anos poderiam tomar: decidimos esconder a panela (ou caneca). Feito isso, fomos dormir felizes e de barriguinhas cheias de brigadeiro com uma pitada de queimado. Tudo lindo, a vida é boa, afinal de contas.
E aí que minha mãe começou a dar falta da panela na manhã seguinte. E por todas as outras manhãs também. E ela não se conformava. Minha mãe tem uma ótima memória. Ela nunca deixa nada passar. Aprendemos isso nessa época. E todo dia ela falava da panela. Até que chegamos a mais temível conclusão: precisamos contar. Mas contar como? Ela vai matar a gente! Primeiro pelo pudim perdido, depois pela panela escondida, e depois por não termos dito nada até agora. Mas vamos contar. Contamos. Não lembro como. Ela riu. Riu muito e contou pra todo mundo e todo mundo riu. Ficamos envergonhadas, porque todo mundo tava rindo da nossa cara, mas melhor que encarar a fúria da minha mãe.
**
Domingo passado, eu decidi que queria comer pipoca assistindo House enquanto meu marido dormia. Tinha dois saquinhos de pipoca para microondas em casa e aí eu lembrei que não tenho um microondas. Ganhei, veio quebrado, não abri a tempo de trocar na loja, assistência só depois do ano novo, enfim. Tive a brilhante idéia de fazer no forno elétrico. Uns 40 minutos depois descobri que o forno queima o papel da pipoca de microondas. Cheiro de queimado por toda parte.
Peguei o segundo saquinho e decidi que era só cortar o saquinho e fazer na panela. Genial. Descobri que pipocas de microondas são nojentas porque além do milho vem uma gosminha junto, que parece sei lá, maionese. Coloquei o milho e a gosminha na panela, um pouquinho só de óleo, porque já tava nojentinho demais, e liguei o fogo. Entrei em desespero quando vi que a panela não tinha tampa por perto. Peguei a tampa da Grill e tampei. Como era de vidro, fiquei encantada de ver os milhos virando pipoquinhas e pulando e fazendo barulhinho. Nessa de parecer uma idiota vendo a pipoca pular, deixei queimar. O fundo da panela ficou todo preto e muitas pipoquinhas também.
Lavei a panela, esfreguei, suei e nada. Eu não podia esconder a panela na minha própria casa, né? O marido jamais se daria conta de que tem uma panela faltando, mas né. Deixei dentro da pia, com água dentro.
**
Uma parte de mim vai ter sempre sete (ou oito) anos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário